LUIZ BORGES
ESPECIAL PARA A FOLHA DO ESTADO
O meu espírito de reconhecimento do humano, sem fronteiras, sem barreiras ideológicas, por vezes me faz desencadear um desejo de experimentar outras realidades onde o viver seja mais adequado e coerente com as formas de vida às quais, penso, são mais humanas.É assim quando visito um lugar. Como aconteceu quando descobri a riqueza cultural do povo boliviano, do povo paraguaio, dos espanhóis, franceses e especialmente os marroquinos e nova-iorquinos. Nos últimos anos, em virtude de assuntos familiares, tenho restringido as viagens à nossa antiga porção de território sul-mato-grossense, a cidade de Campo Grande, onde pude acompanhar o surgimento de importantes equipamentos culturais dotados de interessantes concepções arquitetônicas, como o caso recente do Museu Dom Bosco, a concha acústica Família Espíndola e até mesmo um projeto de urbanização como a Praça do Peixe. Figura que se forma a partir do traçado de seu calçamento, portanto, mais visível em uma vista aérea e propício ao rio Cuiabá. O mais importante disso tudo é que na busca incessante da construção de uma identidade cultural o Estado e a sociedade sul-mato-grossense incorpora as contribuições de seus artistas para nomear espaços, como o centro cultural José Octavio Guizzo, pioneiro na história do cinema mato-grossense, a Sala de Cinema David Cardoso, ator e produtor de cinema que deixou como legado mais de 50 filmes de elevado conteúdo erótico, o Centro Cultural Conceição Ferreira, em homenagem à grande atriz portuguesa da produção mato-grossense, Alma do Brasil e, mais recentemente, a mencionada concha acústica da Praça do Rádio Clube, a talentosa Família Espíndola. Em que pese esse reconhecimento, todavia não significa que, em se tratando de cultura, tudo é maravilha em Campo Grande. Mas, para quem está de passagem, dá vontade de ficar!Enquanto isso, a nossa querida e abandonada Cuiabá se amontoa em buracos provocados pela fraude da aplicação do PAC, nenhuma rua, tampouco um prédio cultural, em homenagem a artistas mato-grossenses. Rubens de Mendonça, Silva Freire e o irreverente ator Liu Arruda são exceções. Os mato-grossenses pagam uma mesa no valor de 500 reais para assistir a shows em espaços precários, inaudíveis, como pude presenciar no show de Leci Brandão e Alcione, e pior, fingindo que ouvem. Neste caso, a boa notícia foi a resposta de Vanessa da Mata, publicada neste jornal, em resposta a um fã que pagou ingresso, não ouviu e teve a coragem de expressar sua indignação. De forma corajosa, a cantora mato-grossense se solidarizou com a espectadora e expôs ao público a vergonha de, na cidade que sediará a Copa, não contar sequer com uma casa de show adequada.Triste situação que me fez por várias vezes pensar em mudar para a Cidade Morena, que me cativa mais por ter um cinema de arte, pouco prestigiado e incentivado como o Cine Cultura.HumanidadePorém, em se tratando do humano e da vida, tudo está em constante mutação. O incidente ocorrido esta semana entre o governador do Estado, André Puccinelli, e o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, maculou a modernidade e progresso da Cidade Morena ao mostrar uma das mais terríveis faces da insanidade pública: em primeiro lugar a falta de educação, e em segundo o preconceito. Nem quero tecer comentário sobre o que foi dito, porque é criminoso. Em qualquer sociedade civilizada se pediria desculpa, pois, ainda que assaltado por fortes emoções, algumas pessoas soltam os cachorros, mas, em se tratando de um chefe de Estado, o mais condizente seria a renúncia ou o haraquiri.Só lamento a atitude anti-cidadã do ministro Carlos Minc de não acionar a Justiça para reparar o dano causado, o que poderia servir de exemplo e alerta aos homófobos de carteirinha de que a falta de respeito à diversidade sexual é crime e dá cadeia no Brasil!Acho que vou ter que ficar por mais um tempo na maltratada porém querida e amada terra de Zulmira Canavarros, Dunga Rodrigues, João Sebastião, Adir Sodré, Clovis Irigaray, Arne Sucksdorff, Sr. Clinio, Gloria Albuês, Lúcia Palma, Luis Carlos Ribeiro, Rai Reis, Domingas, Danilo Bareiro, Roberto Vitório, Gervane de Paula, Pádua, Jonas Barros Vitoria Basaia, Julio Carcará, Macaco Bong, Fúria, Yandra Firmo, Nunes e Marcio Aurélio e Cinco Morenos.Foi mal! Esqueci de indicar um filme. Então fiquem com “Antes do Anoitecer” (EUA-2000), de Julian Schnabel, sobre a vida do poeta Reinaldo Arenas, vítima da perseguição homofóbica promovida pelo regime de Fidel Castro, ou ainda o mais recente “Milk” (EUA-2008), a biografia de Harvey Milk de Gus Van Sant. Ou ainda para entender como o amor homoerótico pode surgir naturalmente na própria família, o inédito e impressionante “Do Início ao Fim” (Brasil, 2009), de Aluísio Abranches.
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