Já não é, se é que algum dia foi, uma evidência que o fato de fazermos teatro de grupo assegura o nosso direito à existência. Usando os mais diversos mecanismos de negociação com a sociedade, tanto a organizada quanto a desorganizada, hoje lutamos simplesmente pelo direito à existência como artistas, o que por sua vez também não é evidente. Em outra formulação: não é evidente que temos o direito de ser artistas. Pelo contrário, tal como se organiza hoje, a sociedade como um todo não nos reconhece como tais. Artistas são os que fazem, nesta ordem, TV, cinema, shows e espetáculos teatrais apoiados por leis de incentivo e pela mídia.
...Comecei a fazer uma brincadeira com os amigos que me telefonam reclamando que eu sumi. Respondo que é verdade, porque entrei para o submundo do teatro. Acontece que essa brincadeira é séria porque o teatro que nós fazemos vive numa espécie de clandestinidade. Isto equivale dizer que a sociedade não está interessada em nós; nós não somos nem sequer uma ameaça para essa sociedade.
É preciso tirar conseqüências dessa realidade, começando por responder a perguntas básicas, tais como: Queremos ser artistas para quê? E no “para quê” mora o perigo. Porque quando a gente fala para, está pressupondo uma estratégia. A pergunta é: nós temos uma estratégia?
O conceito de teatro com o qual nós ainda trabalhamos é o conceito burguês de teatro. Benjamin disse, em outras palavras, o seguinte: não será cultivando a teologia da arte (é assim que ele chama a doutrina da arte pela arte) que artistas e intelectuais encontrarão respostas à pergunta por seu papel e o da arte na sociedade capitalista. Estas respostas serão encontradas na luta por um lugar na produção, o que equivale a dizer na luta pela libertação das forças produtivas, porque artistas e intelectuais desempregados ou supérfluos também configuram desperdício de forças produtivas. A libertação das forças produtivas, aprisionadas pela indústria cultural, depende da apropriação dos meios de produção pelos verdadeiros produtores, os artistas e os técnicos, pois os meios de produção, distribuição e exibição estão presos nas garras do capital.
Melhor do que lamentar o rumo que as coisas da “cultura” tomaram, é entender como funciona a realidade e identificar no que já aconteceu quais as tendências conservadoras e quais as revolucionárias. Para isso, é preciso assumir-se como parte interessada num campo de forças opostas. A renúncia ao enfrentamento com a indústria cultural equivale à opção pela irrelevância social.
Era isso que eu tinha a dizer para começar a conversa. A bola está com vocês.
**Iná Camargo Costa
Nenhum comentário:
Postar um comentário