Amêsa
Estou com pouco tempo em Curitiba. Desci do avião e corri para o largo da Ordem, Sala Londrina, ontem no fim da tarde. Espetáculo baiano para texto angolano, eu tinha que ver.Não conhecia nada de José Mena Abrantes, mas na forma em que foi adaptado e encenado por Suelma Costa ele foi uma viagem.
O palco tem uma mesa, "Amêsa" é o nome da peça e também do objeto-quase-personagem, e flores espalhadas pelo entorno. A iluminação marcada e a música ritmada e sempre presente fazem o resto. E a atriz Heloisa Jorge brilha.
Ela é linda e dança, desdobra seu corpo ao redor, em cima e embaixo da mesa, vestido vermelho, enquanto dispara versos sobre como, tão bonita, precisa ter cuidado, "se não vão te meter em magia". Daí salta para "a criança morreu", no nascimento, "vida não-vivida".
É bem mais sensual e triste do que eu consigo descrever. Seu corpo, de cócoras, de ponta-cabeça, remete para imagens de natureza e mulher.
Da paixão ela vai para a morte da criança e desta parte para a revolta contra o "verdugo" de olhos verdes.
Firme, resoluta, busca deixar "o eu que então eu era" para "o nós que havia no meu eu". E é então que tira o pano negro que prendia seu cabelo e ele se abre, gigantesco e exuberante como o de Nelson Triunfo.
Mas Heloisa Jorge é o Anti-Nelson Triunfo. De Pernambuco, ele partiu do maracatu para o break de São Paulo, é industrial, moderno.
Heloisa parte da Bahia e volta no tempo, cruza o oceano até a Mina que Abrantes ajudou a tirar da colonização européia. A revolta da personagem, no final, é espelho da revolta política, que é africana e que tem suas raízes, deste lado, na Bahia.
Enfim, eu viajei na apresentação. A última é hoje, também às 21h.
Escrito por Nelson de Sá
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